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O quotidiano do Especialista em Suporte de Navegação e Balística
INTRODUÇÃO
Uma das invenções mais importantes dos últimos 60 anos é sem sombra de dúvidas os satélites artificiais, sejam eles de Telecomunicações (Telefonia, Rádio, Televisão e Internet), Exploração de outros planetas e galáxias, Observação, Meteorológicos, Navegação, Científicos, etc.
Os satélites são tão importantes que tornaram a vida de hoje mais simples em diferentes aspectos, por exemplo, como estaria alguém a assistir os lances em tempo real dos jogos do mundial de futebol 2022 no Qatar se ele se encontrasse em Angola? Como um residente da província do Zaire contaria para os amigos que residem na província do Bengo o que está a ver e a fazer naquele instante? Noutros tempos, essas comunicações seriam feitas com um grande tempo de atraso, porque teríamos que usar os métodos tradicionais, gravar os jogos num dispositivo para a posterior visualização para o primeiro caso ou escrever uma carta ou mandar o recado para alguém para o segundo caso. Mas hoje os satélites trazem grandes benefícios para a vida das pessoas.
No entanto, os satélites precisam ser lançados no espaço, mantê-los operacionais, monitora-los e no fim da vida útil removê-los da órbita ou do ponto de trabalho. Para que isso seja possível, é necessário um conjunto de acções e um sistema espacial funcional nos seus três segmentos: Espacial (satélite), Terrestre (centro de controlo e estação terrena) e Lançamento (veículo de lançamento e local de lançamento). Portanto, para um satélite de telecomunicação na órbita geostacionária (Geostationary Orbit-GEO) a Equipa de Suporte de Navegação e Balística ou simplesmente Equipa de Balística, executa as suas tarefas diárias no segmento terrestre, especificamente, no centro de controlo do satélite.
Neste artigo abordaremos o dia-a-dia do Especialista em Suporte de Navegação e Balística ou Especialista em Dinâmica de Vôo, especificamente, para satélites de telecomunicações na GEO, mas sem entrar nos detalhes específicos de operação por razões de confidencialidade que impõe as operações.
Palavras-chaves: Satélite, Manobras, Perturbações, Dinâmica, Vôo e Balística.
DESENVOLVIMENTO
De acordo com Erika Rossetto, líder da Equipa de Dinâmica de Vôo da Star One e Directora da Space Data Association, «um dos aspectos primordiais, quando lançamos um satélite, é garantir a segurança no espaço. Por isso, é preciso ter um controle atento, 24 horas, 7 dias da semana. Precisamos saber exactamente onde ele está e para onde vai.» [1].
O termo Balística, é geralmente usado para descrever a trajectória de corpos. Satélites como ANGOSAT-2 por exemplo, precisam manter a comunicação com o segmento terrestre de forma ininterrupta, para isso, é necessário mantê-los num ponto fixo em relação à Terra o que por vezes é difícil pois o espaço é um lugar adverso [2].
Pois, sob a influência de várias perturbações, o satélite geoestacionário, apresenta complicados movimentos. Além da atracção gravitacional central da Terra, existem muitas forças de perturbação actuando no satélite geoestacionário o tempo todo. Essas forças de perturbação incluem a parte não homogénea e não esférica da atração gravitacional da Terra, as atracções do terceiro corpo, como o Sol e a Lua, a pressão da radiação solar, os efeitos produzidos pelos módulos de propulsão eléctrica durante as manobras, etc. [3].
Por causa dessas forças de perturbação, o semi-eixo maior, o período, a excentricidade, a ascensão recta do nó ascendente e a inclinação mudam com o tempo. Devido ao acúmulo de aceleração de perturbação, o satélite geoestacionário gradualmente se desvia de sua posição de trabalho ideal [3]. O que leva o Especialista de Balística a executar uma série de operações para corrigir a órbita geoestacionária pelo sistema de propulsão do satélite durante todo o ciclo de vida do satélite.
O objectivo da correção de órbita é manter o satélite perturbado dentro da “caixa de controlo” tanto quanto possível. Portanto, as correções ou manobras rotineiras de órbita devem ser realizadas para manter o satélite nas proximidades de sua posição nominal; a vizinhança é chamada de “caixa de controlo”, que geralmente é definida pela faixa de longitude e latitude em relação à longitude nominal. Por exemplo, se for necessário que um satélite seja mantido dentro da caixa de controlo de ±0,05°, isso significa que o satélite deve permanecer em uma região restrita onde o intervalo de longitude é ±0,05° ao longo de sua trajectória e o intervalo de latitude é ±0,05° ao longo da direcção normal. Quanto maior a “caixa de controlo”, mais fácil restringir o movimento do satélite dentro da “caixa de controlo”. Pelo contrário, quanto menor a “caixa de controlo”, mais difícil manter o satélite dentro da “caixa de controlo”. A correção da órbita para manter o satélite dentro da “caixa de controlo” é chamada de manobra de manutenção da órbita e a operação de corrigir a órbita por um tempo e o evento de medições da trajectória do satélite é chamado de período de manutenção da órbita (Station Keeping) [3].
As tarefas quotidianas dos operadores de Dinâmica de Vôo em diferentes projectos não diferem muito umas das outras, porque as estratégias escolhidas para manter o satélite em órbita são muito semelhantes.
Geralmente, a Equipa de Balística trabalha num turno diário de 8 horas, durante todos os dias da semana, incluindo feriados. Portanto, de um modo geral, as tarefas de um especialista de Balística usando o software de Dinâmica de Vôo para o efeito, são as seguintes:
1) Fazer o pré-processamento das sessões de medições executadas pela estação terrena e planificadas para o efeito pela equipa de Dinâmica de Vôo. A equipa planifica para que estas sessões de medições sejam executadas, preferencialmente, no momento em que o satélite está em movimento passivo, ou seja, sem estar sob o efeito de manobras de correcção. Porque fazer as medições quando estão a decorrer as manobras pode influenciar nos resultados das medições. Este pré-processamento serve essencialmente para descartar as medições obstrutivas e levar em conta as correções ionosféricas e troposféricas;
2) Determinação da órbita do satélite com base em medições de trajectória e informações de telemetria na correção da órbita, a fim de se criar uma nova base de Parâmetros Orbitais Iniciais, resultando na definição de um novo Vector de Estado (vector posição e vector velocidade). O sistema de determinação de órbita do satélite é projectado para definir parâmetros de movimento orbital com base em medições de trajectória e avaliação da qualidade das medições de trajectória e, geralmente, o modelo de movimento adoptado na tarefa de determinação da órbita, leva em consideração todas as forças fundamentais que afectam o satélite;
3) Cálculo de manobras para instalação do satélite para pontos de operação (que é feito na fase de reposicionamento do satélite no seu ponto de trabalho), transferência de um ponto de operação para outro (em condições normais de operação esta tarefa não é feita, ela é executada somente se há potenciais riscos de colisão do satélite, quando houver a necessidade de reposicioná-lo num outro ponto de trabalho ou por uma razão que justifique esta acção) e retirada do satélite da GEO (a remoção do satélite da GEO para a órbita de refugo ou cemitério, também é uma tarefa que o especialista de Dinâmica de Vôo executa uma única vez no satélite que está a controlar, isso é, no fim da vida útil do satélite);
4) Fazer o cálculo das manobras para correção do movimento orbital para manter satélite no ponto de operação. Esta acção, independentemente da filosofia utilizada, constitui a acção principal do dia-a-dia do Especialista da Dinâmica de Vôo. Portanto, para efectivação desta tarefa, é necessário que a equipa crie o plano de manobras que é implementado logo após a sua criação de acordo com o cronograma estabelecido para o efeito. Se houver necessidade este plano pode ser actualizado a qualquer momento, excepto se está a decorrer uma manobra ou uma acção na Estação Terrena ou no Centro de Controlo que iniba a sua implementação;
5) Calcular o plano de alinhamento das antenas para a Estação Terrena, a fim de efectuar o alinhamento das antenas em relação ao satélite de acordo com novo plano de manobras;
6) Calcular o plano de eclipses (Terra e Lua). No exercício das suas funções o especialista de Balística pode calcular este plano de forma macro e micro, ou seja, primeiramente pode calcular um plano anual para os eclipses e, por último, nas datas em que estes eclipses vão acontecer, o especialista calcula o plano de eclipses específico para este período. O plano de eclipses é importante na gestão do bom funcionamento do satélite, por exemplo, diferentes restrições podem ser impostas aos intervalos de manobras possíveis, e uma delas é a proibição de realizar manobras durante os intervalos de sombra (quando num só dia acontecerem dois eclipses, da Terra e da Lua);
7) Fazer o cálculo da predição da órbita e analisar os resultados obtidos. O cálculo da predição da órbita do satélite permite ao especialista de Dinâmica de Vôo saber onde está o satélite e onde estará num determinado instante e permite também simular diferentes cenários da trajectória do satélite e da evolução dos seus parâmetros orbitais, bem como de simular ou comparar o comportamento dos satélites próximos ou escolhidos para o efeito. Portanto, esta acção é feita sempre que haver necessidade de executá-la;
8) Processar e analisar o (s) relatório (s) fornecido (s) pelo satélite relacionado (s) com a dinâmica de vôo do satélite. Estes relatórios são disponibilizados na base de dados. Esta acção pode ser feita diariamente;
9) Calcular os comandos relacionados a Dinâmica de Vôo para serem enviados para o satélite e notificar a equipa de controlo para enviarem o comando ou os comandos a bordo do satélite. Geralmente, esta acção é feita de acordo com o cronograma estabelecido ou quando a situação o exigir.
Outras tarefas que também fazem parte do quotidiano do especialista de Balística são:
1) Calcular a actualização das acelerações. Esta acção é necessária durante a fase de reposicionamento e de operação do satélite. Por exemplo, se o erro da variação da longitude for superior a 0,5 s, a actualização do coeficiente dos componentes da aceleração é necessária ou quando é notada uma grande diferença nos limites dos valores relativos entre a primeira e última medição.
Outra forma é quando há uma variação importante da massa do satélite devido a redução do combustível que é usado durante as manobras. Mas estas actualizações são feitas somente quando for necessário;
2) Calcular os intervalos de interrupção solar (sun outage) para as antenas da Estação Terrena. Porque, quando os três objectos, satélite, as antenas receptoras apontadas para o satélite e o Sol estão alinhados em linha recta, os sinais de satélite adquiridos serão degradados por interferência ou sua a aquisição pode até se tornar impossível. Isso se deve ao facto de que os sinais do transponder são sobrepostos por um ruído solar mais potente;
3) Participar na resolução de Situações Não-nominais ou de contingência (Off-Nominal Situations-ONS) do satélite e fazer as devidas recomendações;
4) Participar nas reuniões em que é convocado e realizar as tarefas que lhe são atribuídas relacionadas as operações ou ao Centro de Controlo.
A Equipa de Balística interage permanentemente com as demais equipas do Centro de Controlo, embora esta interacção seja de forma menos activa com certas equipas, mas a equipa está sempre disponível para prestar esclarecimentos ou informações que lhe são solicitadas pelas diferentes equipas e vice-versa. Além das tarefas diárias das operações de controlo, a equipa também pode ser orientada a pesquisa e investigação e ao desenvolvimento do software de Navegação e Dinâmica de Vôo do satélite a controlar, entre outras tarefas.
CONCLUSÃO
Portanto, a Equipa de Suporte de Navegação e Balística no Centro de Controlo de satélite, no seu quotidiano, tem a missão de controlar a Dinâmica de Vôo do Satélite, estimar e aferir a trajectória do satélite durante as fases de inserção, reposicionamento, exploração operacional e fim de vida útil do satélite, por intermédio de cálculos matemáticos e físicos, para poder corrigir essas trajectórias com o menor consumo de combustível possível visto que é um dos principais recursos que condiciona a vida útil do satélite.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
[1] https://proximonivel.embratel.com.br/erika-rossetto-presenca-feminina-e-restrita-na-industria-de-satelites/ (consultado online dia 21/11/2022);
[2] BOLETIM ANGOSAT. ANGOSAT-1 O PRIMEIRO SATÉLITE ANGOLANO. Boletim Informativo do Gabinete de Gestão do Programa Espacial Nacional. Julho 2017-Nº001-TRIMESTRAL-ANGOLA;
[3] LI, Hengnian. Geostationary Satellites Collocation. Springer. ISBN 978-3-642-40798-7 ISBN 978-3-642-40799-4. Springer Heidelberg New York Dordrecht London. September 12, 2012.
AUTOR:
Custódio Diengue Abílio
Mestre em Engenharia e Gestão Industrial e Licenciado em Mecânica pela Universidade Hassan 1, Marrocos.
Especialista da Área de Suporte de Navegação e Balística do Centro de Controlo e Missão de Satélites da Funda.
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